quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Entre dois lugares

Hoje pela tardinha, já amornecia, encostei-me a uma parede cálida, a ver passar figuras, que pareciam saídas de um filme antigo.
Abrigada numa ruela estreita, entre prédios altos e paredes brancas, uma escola de música, um café e um teatro.
As janelas estavam abertas, com miúdos a versejarem as teclas,
simples, delicioso.
Detive-me numa mulher frágil, que anda sempre por ali, serigaita e ondulante, a deslizar pela calçada, e a olhar para todos os lados; fui-a perdendo de vista,
Alonguei-me no olhar e, segui o dono duma loja, que vende roupa hilariantemente cara, e que subia a rua, indiferente, de braços estendidos, com o seu ar símio.
Lembrei-me da loja no Centro, em Carnaxide. Da dona, uma mulher, inchada, menopausica, imagino. Insuportável, nas suas tiradas histéricas.
Vestia sempre, túnicas esvoaçantes, com pretos e cores vibrantes, que distraíam as misérias da carne. As clientes, eram mulheres que procuravam tamanhos grandes, que se cobrem de panos e se maquilham furiosamente.
Vi sair do café, o dono da sapataria, num passo apressado e cabisbaixo, em direcção à loja. Sempre,
uma imagem inquieta.
Lembrei-me de quando passo por ali, e não o vejo à porta, de mãos atrás das costas, num sorriso engelhado, que culmina num esgar, e olho para dentro da loja e não o vejo, interrogo-me sempre por onde andará.
Talvez neste café; fica ali tão perto, e os clientes escasseiam cada vez mais.
A música, entretanto deixou de se ouvir, e as imagens desvaneceram-se, a calçada ondulou até se ajeitar sozinha,
em casa.

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